Apesar do esforço para aumento da taxa de poupança nacional e melhoria da qualidade em educação financeira, ainda notamos uma enorme resistência para criar um mercado de investimentos semelhante aos mais desenvolvidos do mundo. O mercado financeiro ainda é considerado por uma enorme parcela dos brasileiros um lugar inóspito, povoado por figuras míticas, que produzem riqueza a partir do zero, personificando o lendário Midas. A despeito de deficiências estruturais, dadas a concentração de renda, lacunas na educação básica e a alta carga tributária, parte da explicação talvez resida na dificuldade em se estabelecer uma comunicação fluida entre os players do mercado e os investidores.
Além da gigantesca concentração bancária, nota-se uma assimetria também por produtos, tendo a renda fixa como carro-chefe do direcionamento da sobra de dinheiro, independente da classe social. É verdade que os juros altos desestimulavam olhares para mercados menos “seguros”, no entanto os poucos períodos recentes com juros menos estratosféricos não produziram uma base sólida de investidores dispostos – ou capazes – de enxergar alternativas muito além da poupança ou de fundos DI. Não é raro ouvir de profissionais liberais, empresários e assalariados, que um dia se expuseram ao doce canto do ganho sem risco, a frustração ao se deparar com perdas colossais.
As corretoras e gestores de recursos, até em face de obrigações regulatórias, sempre apresentam os potenciais riscos associados a cada tipo de investimento e, em grau mais ou menos sofisticado, procuram apresentar o melhor casamento entre o perfil de investidor e os produtos mais adequados – o chamado Suitability. Embora este tipo de iniciativa ajude, não parece solidificar um espírito de investimento mais perene, necessário e condizente com um contexto de fomento e não de pura especulação. O problema não está no plano da regulação, até porque nossos xerifes do mercado, aliados a regras muito bem desenhadas, estão constantemente se aperfeiçoando para evitar desvios e abusos.
Traçando um breve paralelo com o mercado americano, saltam aos olhos algumas diferenças. Apesar de não ser um mercado imune a crises, vide o estouro das empresas .com em 2.000 e mais recentemente a quebra do “sub-prime”, o mercado americano possui alicerces mais robustos. A questão é mais profunda e está no domínio da cultura de investimento, dos argumentos e motivações em destinar uma determinada quantia da renda mensal para poupança. Enquanto o americano médio investe olhando o longo prazo, o brasileiro médio, quando investe, normalmente busca retornos no curto prazo. Paradoxalmente, este mesmo brasileiro médio tem acesso e é fuzilado com inúmeras opções de aplicação, de simples fundos até produtos estruturados como o COE. Basta abrir a carteira de um americano médio e veremos basicamente três tipos de produtos: ações, ETFs e bonds. Nada de pirotecnias ou estratégias sofisticadas, mas tão somente o bom e velho feijão com arroz.
É salutar e imprescindível a disponibilidade de uma gama de alternativas para investimento. Contudo, vivemos um momento único para estabelecer um novo patamar de aplicadores conscientes. Além de juros reais histórica e estruturalmente baixos, estamos diante de uma realidade previdenciária dura e inegável. São elementos poderosos para desmontar a tese fácil da renda farta, líquida e sem risco. O mercado de ações ou o nosso mercado de bonds pode ser facilmente retransmitido, através de uma mensagem de longo prazo, de aposentadoria, como vemos nos mercados mais desenvolvidos. Não se trata de defenestrar as “small caps” ou títulos do governo, mas tão somente apresentar cenários onde as ações de sólidas empresas ou debêntures de longo prazo possam servir de lastro para renda e conforto na velhice.